Uma equipe internacional liderada por cientistas da Harvard Medical School e Boston Children’s Hospital, dos Estados Unidos, descobriu uma nova mutação genética que pode ser a causa raiz de quadros graves de glaucoma infantil.
Por meio de tecnologia avançada de sequenciamento do genoma, os pesquisadores identificaram uma mutação no gene da trombospondina-1 (THBS1) em três famílias etnicamente e geograficamente diversas com histórico da doença na infância.
Os novos achados, publicados no Journal of Clinical Investigation, podem levar a uma melhor triagem e tratamentos mais precoces e direcionados para prevenir a perda de visão em crianças com a mutação.
Em seguida, entenda como foi feita a pesquisa.
Glaucoma infantil
O glaucoma infantil, ou congênito, é uma doença rara, mas grave, que se manifesta em crianças desde o nascimento até os 3 anos de idade. Apesar de sua raridade, é responsável por 5% dos casos de cegueira infantil em todo o mundo.
Crianças com o problema geralmente requerem cirurgias já nas primeiras semanas ou meses de vida, eventualmente seguidas por outras operações durante a infância.
Geralmente, há um forte componente hereditário, com vários membros de uma família afetados pela doença. Desse modo, ao entender melhor os genes envolvidos, os testes genéticos podem dar tranquilidade às famílias afetadas para saber se seu filho pode estar em risco de desenvolver a doença.
A pesquisa
Os cientistas usaram um conjunto de dados de mais de 34 mil adultos com glaucoma para identificar 127 genes associados à doença.
Para estudar melhor as mutações genéticas no glaucoma infantil, primeiro foram sequenciadas todas as regiões codificadoras de proteínas dos genes no genoma (exoma) de uma família americana de ascendência europeia-caucasiana que havia feito parte de um projeto de pesquisa anterior.
Os cientistas encontraram uma variante nova e surpreendente na trombospondina -1, uma proteína bem conhecida envolvida em vários processos biológicos importantes, como a formação de novos vasos sanguíneos (angiogênese) e tecidos.
Este gene mutante não foi encontrado em pessoas sem glaucoma infantil, nem em grandes bancos de dados genéticos populacionais. O aminoácido alterado pela mutação foi conservado evolutivamente, indicando um papel importante na função da proteína.
Esse achado levou a equipe a buscar apoio da Flinders University, na Austrália, para ver se havia alguma família com glaucoma infantil com mutações de trombospondina no país. E descobriram que sim.
Para avançar ainda mais essa hipótese, os pesquisadores desenvolveram um modelo de camundongo com a mutação THBS1 e observaram que o animal também apresentava características de glaucoma.
Os resultados
A princípio, presumiu-se que as mutações THBS1 estavam interrompendo a formação de vasos sanguíneos no olho. Entretanto, os modelos animais mostraram angiogênese normal.
Em seguida, a equipe notou que a mutação causava o acúmulo de proteínas anormais da trombospondina nas estruturas de drenagem intraocular do olho, envolvidas na regulação da PIO; o que, por sua vez, levava a elevação da pressão e dano ao nervo óptico e camada de fibras nervosas da retina, provocando perda de visão.
Esta foi a primeira vez que identificaram esse tipo de mecanismo da doença que causa o glaucoma infantil.
Próximos passos
O estudo tem implicações clínicas significativas. Embora ainda haja mais trabalho antes que testes genéticos abrangentes possam ser oferecidos, cada gene encontrado apresenta outra oportunidade para identificar mutações causadoras nessas famílias por meio de triagem.
Terapeuticamente, o conhecimento dessa mutação genética pode levar a tratamentos mais precoces com terapias convencionais. Por exemplo, se um bebê nasce com essa mutação, o oftalmologista pode informar melhor os pais sobre os riscos e desenvolver um plano de tratamento e monitoramento da doença apropriado.
A identificação desse novo mecanismo e gene na raiz do glaucoma infantil também pode levar a novas terapias que visam o combate ao acúmulo de proteínas anormais.
Os pesquisadores também pretendem determinar se outras mutações THBS1 estão envolvidas na doença de início adulto, como glaucoma primário de ângulo aberto ou formas mais leves da doença.
A equipe também continuará procurando novos genes associados ao glaucoma infantil na esperança de um dia desenvolver uma triagem muito abrangente.
Revisado por Paulo Schor, médico oftalmologista, professor livre docente e diretor de inovação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e colaborador da Faculdade de Medicina do Hospital Albert Einstein.
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