A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma doença ocular que afeta bebês prematuros. De acordo com o oftalmologista especialista em doenças da retina e retinopatia da prematuridade Samuel Montenegro, a ROP é uma das principais causas de cegueira prevenível na infância, sendo responsável por 50 mil crianças cegas em todo o mundo. No Brasil, a estimativa é de 13,5 mil casos anualmente e, deste total, 1 mil bebês poderão precisar de tratamento.
Por isso, a identificação dos recém-nascidos (RN) que necessitam de tratamento é imprescindível para a redução da cegueira por ROP. Bebês prematuros com até 1,5 quilo e/ou nascidos com idade gestacional de até 32 semanas fazem parte do grupo de risco da doença.
Esse período ainda pode se estender até 35 semanas caso a criança apresente sepse, hemorragia intraventricular, síndrome do desconforto respiratório, necessidade de transfusões sanguíneas e se a mãe teve uma gestação múltipla, mesmo com peso maior que 1,5 quilo.
Isso porque o desenvolvimento dos vasos sanguíneos da retina do neném pode ser interrompido com o parto prematuro. Neste caso, a vascularização pode se dilatar, retorcer ou até mesmo romper. Em estágio avançado, pode levar à formação de cicatrizes na retina ou até mesmo ao deslocamento da retina, o que pode resultar em perda permanente da visão.
A Classificação Internacional da ROP (ICROP) definiu a doença conforme a gravidade (estadiamentos 1-5), localização (zonas I-III) e extensão em horas (1-12 h), com ou sem doença plus (dilatação arteriolar e tortuosidade venosa), cuja presença seria um indicador de atividade da doença (4-5).
Confira a tabela:
Classificação da retinopatia da prematuridade | |
Estágio 1 | Linha branca e plana que separa a retina vascular da avascular |
Estágio 2 | Crista elevada |
Estágio 3 | Proliferação fibrovascular a partir da crista |
Estágio 4 | A proliferação pode provocar um descolamento de retina subtotal, (4a, extrafoveal; 4b, descolamento total, incluindo fóvea) |
Estágio 5 | Descolamento total de retina (funil aberto ou fechado) |
Doença limiar (definido pelo CRYO-ROP) (se não tratada pode apresentar resultados anatômicos ruins em 50% dos casos) | Retinopatia Estágio 3, em zona I ou II, com pelo menos cinco horas de extensão contínuas ou oito horas intercaladas, na presença de doença “plus” (dilatação arteriolar e venodilatação) |
Doença pré-limiar tipo 1 (definido pelo ET-ROP) | Qualquer ROP em zona I com plus (doença posterior agressiva) Estágio 3, zona I, sem plus Estágio 2 ou 3 em zona II, com plus |
Doença pré-limiar tipo 2 (definido pelo ET-ROP) | Estágio 1 ou 2, zona I, sem plus Estágio 3, zona 2, sem plus |
Fonte: Proposta de diretrizes brasileiras do exame e tratamento de retinopatia da prematuridade (ROP).
Avaliação da retinopatia da prematuridade
Samuel Montenegro examinando um recém-nascido com o Eyer. Foto: arquivo pessoal.
A ROP tem duas características perigosas: é silenciosa, pois não apresenta sintomas visíveis, e evolui muito rápido. Por isso, é fundamental seguir os protocolos internacionais e nacionais para o diagnóstico e tratamento precoce.
Montenegro explica que o exame oftalmológico de rotina em prematuros deve ser feito quatro semanas após o nascimento. “A criança não nasce com a doença, por isso é fundamental avaliar nesse período”.
O exame deve ser realizado por oftalmologista com experiência em avaliar prematuros e com conhecimento da doença para identificar a localização e as alterações retinianas sequenciais.
*Imagem feita com o Eyer. Foto: Samuel Montenegro.
O agendamento dos exames subsequentes deverá ser determinado pelos achados do primeiro exame.
Após identificar a ROP, Montenegro faz o acompanhamento e documentação dos pacientes com o retinógrafo portátil Eyer. O equipamento, bastante indicado para exames em bebês e crianças pela portabilidade e associado à alta qualidade de imagem, funciona acoplado a um smartphone e realiza exames de retina em poucos minutos, além de disponibilizar as imagens na plataforma online EyerCloud, facilitando o estudo e acompanhamento da progressão dos casos pelos médicos.
*Imagem feita com o Eyer. Foto: Samuel Montenegro.
“O aparelho veio como um divisor porque me auxilia muito no registro da retina do paciente naquele exato momento de forma prática, rápida e com alta qualidade”, afirma. Antes, o especialista usava uma lente de mapeamento de retina com auxílio de um smartphone para fazer vídeos. “Depois eu congelava a imagem, tirava um print e armazenava no computador. Era muito trabalhoso”, relembra.
Tratamento da retinopatia da prematuridade
Montenegro explica que o tratamento é efetivo quando a ROP é identificada no início. “O segredo dessa doença é o diagnóstico precoce e o tratamento imediato, quando necessário”.
Atualmente, a ablação da retina com laser é o tratamento ouro. Existem também alternativas, dependendo do estágio, como a injeção anti-VEGF e a crioterapia. “Nessa doença, nós lutamos contra a cegueira. Então, aplicamos a terapia com laser para a criança não cegar nos casos em que é a melhor indicação. Mas, isso pode restringir o campo de visão permanentemente”, pontua.
A criança com ROP receberá acompanhamento por uma equipe multidisciplinar: oftalmologista pediatra, retinólogo, terapeuta ocupacional e fisioterapeuta. Esse seguimento se estenderá após a realização da ablação retiniana, com o intuito de obtermos a estimulação visual precoce.
“Os recém-nascidos que foram diagnosticados para ROP apresentam uma maior chance de desenvolver problemas oftalmológicos no futuro, como estrabismo, ambliopia e erros refrativos. Desse modo, é recomendado o seguimento oftalmológico após a alta”, ressalta.
Samuel Montenegro examinando um recém-nascido com o Eyer. Foto: arquivo pessoal.
ROP Brasil
Montenegro faz parte de um projeto, o ROP Brasil, que visa compartilhar conhecimentos e estudar mais sobre a retinopatia da prematuridade.
Diversos levantamentos apontam que a proporção de cegueira causada por ROP é muito influenciada pelo nível de cuidado neonatal (disponibilidade de recursos humanos, equipamentos, acesso e qualidade de atendimento), assim como pela existência de programas eficazes de triagem e tratamento. Por conseguinte, existe uma grande variabilidade de ocorrência da doença em países desenvolvidos e em desenvolvimento.
“Por isso, conhecer mais sobre a doença é fundamental para diminuirmos os casos de cegueira prevenível em crianças no país”, afirma.